segunda-feira, 24 de novembro de 2014

sob a vaidade



minha vaidade acaba com a mirada no espelho

Toulouse-Lautrec



Talvez meu favorito.
Revelação do mundo, ele o aleijado, olhando essa beleza decadente, testemunha que lança aos séculos estas cores, a deselegância das meninas, o salto, as mãos abertas pousadas no macio das almofadas gastas e puídas pelo amor dos outros.
Os cartazes de propaganda, eu também quero ir lá testemunhar e desenhar dizendo aos outros que essa dor acaba quando eu a lanço ao mundo.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

andam dizendo por aí

                                                                                                                                                       simão salomão

você não sabe o que eu não sei
nem eu também
o que eu sei
(e o que você sabe)
é melhor ficar por aqui

sábado, 15 de novembro de 2014

a noite estrelada



aqui estou vendo o anoitecer
embora não haja silêncio
- há gritos e estertores
e gozos e folguedos,
ameaças de bombas
e censuras e dedos em riste,
o óbvio de uns e alteridades,
e  a velocidade  a estragar a paisagem
tantas verdades
chegam a gritar pelo retorno do arreio 
e nudezes envergonhadas
e no mais das vezes
anedotas sobre a infelicidade alheia
e toda a culpa é sempre do distante
eu permaneço quieto
- somente a noite estrelada -
e eu estou em silêncio
porque é isso que eu tenho a dizer agora
é o que eu sinto
sinto muito

ladrões diversos


ladrões diversos confessaram
tudo já estava lá só que alguém não furtou antes

a esperança



hoje em dia
eu estou menos em dia
com o calendário
estou ontem
como antigamente se dizia
e se amanhã
vai ser outro dia
num exercício de futurologia
eu entrego a ele
toda a esperança de transcêndencia

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

o meu próximo

Sou semelhante a ele em tudo, mas ele não sou eu.
Ele é um outro, parecido comigo. Fala, mente, chora, ri. Sonha, delira,faz e espera. Ouve.
Eis o meu próximo, distante. Equivalente, covarde. Fracasso que anda.
Um homem, um bicho. Um animal. Nessa natureza errante. Mais um outro.
Um dia ainda te pego.

mais um pouco



mais um pouco desse nada 
e minha vida transborda tudo

interrogação



como sei o que será
só depois de acertar
melhor esperar

como saber o que será 
é ter que esperar
melhor...

o que será?

domingo, 9 de novembro de 2014

a vida não cabe no bolso #



"a vida é nascer, procriar e morrer"
e o que faço com o meu espanto?

de longe tudo é mais bonito



de longe tudo é mais bonito
inclusive o passado
até mesmo nós dois de mãos dadas
e os filhos que nós não chegamos a ter
os funerais que não fomos
as brigas que sequer tivemos
de longe tudo é mais bonito
de repente o céu pode se abrir
e me levar pra sempre daqui

dois velhos amigos #


- estamos atrasados.
- pra quê? a gente nunca faz nada mesmo.
- por isso mesmo.

dois velhos amigos #


- cheguei a conclusão que não posso acreditar em tudo que leio...
- ah é... por quê?
- num site de jogos está escrito que jogar paciência é divertido.

sábado, 8 de novembro de 2014

e o mesmo Tejo



odeio isso aqui
mas não posso viver sem
perder é ruim
até quando é vício

nenhuma novidade
estou mais uma vez de chapéu
pedindo só um olhar
e que você fique mais uma vez comigo

venha até aqui
antes que eu vá embora
sempre tem algum senão
mesmo quando tudo parece certo

tudo sempre por aqui
as mesmas cores
o mesmo Tejo
a respingar o velho tédio

retroalimento



não é o que vejo
é como vejo
e como é com isso que me alimento

não é como faço
mas como é fácil
fazer o que faço com o que vejo

como tudo que está aí
é alimento para ver o que vejo
é assim que faço, tudo é retroalimento





quinta-feira, 6 de novembro de 2014

dead man # 2

eu pensei em fugir
mas não há lugar para onde ir
eu falei em dar o fora daqui
mas é melhor esquecer o que eu disse
esta é minha terra e a aqui é o meu lugar
eu vou lutar

dead man # 1


sou um homem morto
com alguns trocados no bolso
minha vida foi a melhor vida que tive,
apesar do corpo aqui largado
sozinho eu deslizo, enfim desligado de tudo ao redor.

enquanto meu corpo flutua
eu vejo as coisas como elas são,
tive o melhor que pude de mim
lutei comigo e venci, agora estou jogado na rua
cada vez com mais certeza: alguns poucos trocados não fazem diferença não.
tudo que meu braço alcança
é aquilo que meus olhos veem
não, não me venham com aquela estória
de alguns poucos trocados no bolso
nessa eu não caio mais não.
flores e versos
fizeram parte do meu caminho
se hoje eu estou aqui caído
é que isso fazia parte de meu destino
nunca sonhei sair dessa sem arranhão
assim que eu for apenas mais uma lembrança
façam o quiserem com meu corpo
e quanto aos trocados
bem, tomem mais uma em meu nome
e esqueçam minha canção

terça-feira, 4 de novembro de 2014

museu do carinho



O Museu do Carinho existe, e embora receba poucas visitas, está aberto e em funcionamento em alguma pequenina cidade perdida desse continente escolhido e esquecido pelo grande arquiteto dessa imensa bosta.
Os museus existem para recolher,  guardar, registrar, classificar e organizar para as atuais e futuras gerações aspectos relevantes das culturas dos povos.
Aspectos esses, únicos,originais, especiais e representativos de um período.
Antes da era da reprodutibilidade os museus guardavam e priorizavam aspectos singulares, autênticos, únicos, originais, que não podiam ser facilmente reproduzidos, mas aí veio o contemporâneo e os aspectos a serem considerados (de certa forma pois tudo tem que ter uma ressalva) passaram a ser aquilo que pudesse reproduzido, que não fosse único.
Dessa forma, por um lado - vale aqui essa ressalva - o Museu do Carinho guarda, registra, classifica e organiza os numerosos gestos de carinho:
cafunés
e cheiros,  principalmente, mas a lista é enorme:
atirar beijos,
bater os copos,
matar piolhos,
levantar a saia,
fazer as pazes,
espantar mosquitos,
conversar de mãos dadas,
dormir de conchinha,
tirar o chapéu,
salamaleques,
dar licença,
misturar os pés,
desejar bom dia,
por favor,
com licença,
muito obrigado
e inúmeros outros gestos, e palavras, que estão esquecidos, daí a necessidade deles estarem organizados e guardados num museu.
A grande contradição (existe um Museu da Contradição também, mas esse fica na Ásia ou próximo à Estação Finlândia; igualmente existe o Museu da Paz, o Museu do Amor, e outros tantos Museus, onde estão guardadas preciosidades únicas, singulares e autênticas) repito, devo repetir, pois os parênteses(será que existe um Museu dos Parênteses ?) repetem-se com frequência cada vez mais constante ( e irritante), a grande contradição, desconheço se dialética ou aquela que faz parte da lógica formal, é que embora não seja contemporâneo o carinho, embora único,  etc., deve ser reproduzido!
Cada vez mais raro o carinho, único em sua forma delicada, originalmente feito pelo individuo, autêntico em sua profunda sinceridade, luta para ser contemporâneo, ser reproduzido em cada lar, em cada gesto, em cada toque, em cada vista.
A validade dos museus, a luta para ser contemporâneo, com carinho aos Mestres, Walter e Cascudo.

amor



não é para ser falado
fica melhor
ao pé do ouvido

assombrado com tudo



assombrado com tudo 
com qualquer suspiro
qualquer fio 
assobio
pedrinha
desvario
palavra
canção
aceno
rio
ai
fim

domingo, 2 de novembro de 2014

empate



você vem
eu fico

dá-me tuas dúvidas
dou-te minhas reticências

me dá tuas mãos
te dou meus sonhos

é esse o tipo de nó que a gente tem