terça-feira, 27 de julho de 2021

saí pra dar um rolê no bixiga



Saí pra dar um rolê no Bixiga.
Levava numa sacola algumas coisas pra fazer. Doar roupas, comprar uma peça de um mixer, trocar a sola de um sapato.
Subo a 13, a minha rua.
Deixo algumas peças de roupa na escadaria; logo alguém aparece pra pegar.
Eu tinha quebrado, sem querer, a parte que solta do Mixer e fui comprar uma nova. Tem uma lojinha na 13 que vende esse trecos. Toda essa rede de pequenos comércios, lojinhas, é que dão a cara a um bairro. Em cada pedacinho, em cada porta, , em cada canto, eu lembro de alguém, de alguma música, de tudo que ainda é.
A peça é feita pra ser quebrada, como os copos de vidro e as vidraças das agências bancárias; fui saber só depois que o preço de uma nova era só 30% mais caro que a peça. Enfim... tudo pelo rolê.
Na loja de trecos perguntei sobre a a Italmocassim, a última loja de sapatos do Bixiga; o vendedor disse que ela estava fechada, o dono morreu.
A última das lojas de sapatos, das tantas que existiram. Um sapato da Italmocassim, não é igual a um mixer vagabundo. Mostro a sola estraçalhada, é uma sola confort; me disseram que um sapato assim não podia ficar guardado dentro da caixa, é uma sola de borracha, o sapato é uma delícia, quero consertar de qualquer jeito.
O atendente da loja diz que uma funcionária que trabalhava  na Ital agora está trabalhando no sacolão logo ali em frente.
O vendedor puxa um papo falando das profissões que vão se extinguindo (os filhos do dono da Italmocassim não quiseram continuar o negócio) e novas profissões vão surgindo...  acho um inferno as coisas de plástico ou com tomada, a obsolescência programada, o fim das lojas de sapato no bairro, a invasão americana, o fim do uso dos sapatos, a calça jeans, o fim das associações de classe. Digo:
Nem sei o que falar sobre isso. Não falo nada,  mas me despeço dizendo que foi uma boa conversa.
No sacolão pergunto pra uma e outra se ela era a ex-vendedora. Mostro meu sapato (no dia eleição passada ele arrebentou bem em frente à estátua de são José; era domingo e eu pude comprar outro sapato na feira da Dom Orione e pude ir trabalhar convenientemente vestido...) ela diz que não tem conserto!
Penso comigo: vou encontrar um sapateiro, um bom sapateiro.
Trabalhei em 1978 como office boy numa revista naquela galeria, a Galeria Espiral.
A Galeria Espiral vale um passeio, precisa ser revitalizada, é certo, mas tem essa estrutura em espiral, uma arquitetura estilo Bienal. Ela  tem a entrada principal na Rui Barbosa esquina com a Brigadeiro;  tem um número expressivo de lojas: são clubes, cabeleireiros, despachantes, um alfaiate, costureiras, mas não tem sapateiros, assim me disse uma jovem que fazia a faxina.
De volta a minha busca entro na Pedroso, desço a Martiniano; um passe na Messiânica.
Sim, um passe. Respondo ao rapazinho que ministrou o Johrei que conheço a igreja desde 1972; minha vó Sinhana a frequentava, depois minha vó Zizita.
Na Martiniano o 312, casa da Sinhana, não existe mais, o 271, da Vila Itororó, está com tapumes. No apartamento do meu tio Durval, na frente da igreja, moram outras pessoas há 45 anos.
Vou até a secretaria da igreja do Carmo comprar um escapulário (quem morrer usando esse escapulário não vai pro inferno), mas esse tipo de venda só ocorre no horário de missa.
Volto a Brigadeiro e desço a Francisca Miquelina, onde moramos na primeira infância em dois predinhos em sequência.
Na Maria Paula encontro o último dos moicanos, o último dos sapateiros, Sapataria Mosley.  O conserto sai caro, o preço de um sapato novo, mas não um sapato da Italmocassim.
Vou voltar, antes uma passada no sacolão; frutas.
Na Pérola Byington existe um acampamento, tanta gente nas ruas,
muitas barracas. Um rapaz de longe, grita.

- Ê cachoeira! como é que você está?!
- Firmão.
Nunca vou deixar esse bairro.

segunda-feira, 26 de julho de 2021

o que eu posso?



o que eu posso
com essa alma desatenta
com tanta treta
o que eu posso?
o que eu posso
lago que me atormenta
logo tudo queima
quer queira ou não queira
o que eu posso?
o que eu posso
o fio logo, logo arrebenta
tudo sem ligação
lama que me deixa lenta
fumaça densa
o que eu posso?
o que eu posso que caiba
nesse sentimento
pobre momento
noite de sereno
desvario sem jeito
será que eu mereço?
o que eu posso
além de um fio de cabelo
da precisão de um beijo
de seu sexo, de novo endereço
sem embargo no peito
sua mão a me guiar na noite sem estrelas
caminhar noite adentro
o que eu posso?
de novo seus olhos negros
e o instante a se perpetuar
sem fim nem começo

sábado, 17 de julho de 2021

nomadland



Ontem fomos ao cinema, á tarde que é o horário que eu mais gosto de ir. Parece gazeta, parece um ultraje ao mundo de merda do maldito trabalho. Adoro Sessão da Tarde.
Nomadland. Se eu disser que chorei o filme inteiro não estou mentindo. Falando do filme com a Adri eu estive preso a uma certa visão de necessidade econômica, de pauperismo que obrigava as pessoas a deambular, mas a Adri me alertou que existia o amor á estrada, ao nomadismo, então Por necessidade e por estilo de vida, cair na estrada, continuar a continuar.
A grande revanche é mandar tudo a merda e por o pé na estrada. On the road again.
Ou numa pausa da estrada até gostar de um trabalho simples e sentir-se útil, e cair na estrada de novo.
Relacionamentos profundos e extremamente amorosos que duram apenas alguns dias.
Grandes encontros. Grandes conversas. Filosofia. O que é Filosofia? meu sogro Luis Maia perguntou. Filosofia é o amor a vida, a sabedoria; a busca da essência das coisas, procurar saber viver.
Grandes são os desertos da minha alma.
A Frances é tão maior que qualquer outra. Fiquei apaixonado pela Linda May e respeito muito a Swankie, porque é meu oposto.
São tantas cenas maravilhosas.
Hoje lembrei, ao assistir o filme, em outra cena tão linda, que somos estrela, alô Ligia Evangelista, e chorei de novo. Choro como um cão danado, como o velho que sou, como a criança que fui. Me sinto gente e Miele chorando.
Uma das cenas mais lindas do filme é Frances falando o soneto 18, alô Duda Miranda, de Shakespeare.

Se te comparo a um dia verão
És por certo mais belo e mais ameno
O vento forte espalha as folhas de maio pelo chão
E o tempo de verão é sempre bem pequeno
Às vezes brilha o sol no céu em demasia
E outras vezes ele desmaia com frieza
E tudo o que é belo declina num só dia
Por acaso ou na eterna mutação da natureza
Mas em ti o verão sempre será eterno
E a beleza que tens tu nunca perderás
E também não chegaras da morte ao seu triste inverno
Pois nestas linhas eternas com o tempo crescerás
E enquanto nesta terra houver um ser
E olhos que possam ver, meus versos vivos te farão viver.

Outra cena linda do filme é a Swankie falando sobre as coisas lindas que ela viu durante a vida, pequenos milagres, algo simples, como o primeiro voo das andorinhas ao abandonar os ninhos, alô Marilia Miele, ontem nos fez lembrar de milagres!
Eu conheço a música do Ludovico Einaudi, e os pequenos milagres.
Esse filme é um pequeno milagre, um semidocumentário, com atores amadores. é uma declaração de amor ao espirito livre americano e uma crítica ao capitalismo selvagem.
O cinema é esse mundo de magia e segredos que são compartilhados, Clara Vasconcelos.
O cinema tem que ser isso, um pequeno milagre.




a selva



provei-te e regalei-me
e você estava inteira comigo
oh! divina dama do dia e da noite
aproveite-me 
devore-me
e devolva-me a selva

Os melhores anos de uma vida



Hoje assistimos: Os melhores anos de uma vida. Com Anouk Aimeé e Jean Louis Trintignant, no Clube do Professor, sessão ás 11 da manhã.
Antes da sessão vi que o filme era francês, era o que sabia do filme.
Lá dentro , mais meia dúzia de pessoas na platéia, fiz as ligações; as cenas em preto e branco, aquele lindo casal, era o mesmo casal de velhinhos; que era aquele filme: Um homem e uma mulher, 50 anos depois. Muito elegante. Quando penso em elegância logo penso no meu ex-vizinho, Zédu, o mais elegante do Mantiqueira. No edifício 13 de Maio o páreo é duro: Chico e Renato, muito luxo prum prédio só.
50 anos depois o Trintignant nem levanta da cadeira de rodas, mas continua sedutor e, apesar do Alzheimer, fala vários poemas de Verlaine, o que enobrece qualquer película. Acho difícil esquecer da Anouk Aimeé.
A música do Francis Lai, é o sabada badá, você conhece e canta junto,.
Um filme francês é um filme adulto.
O amor na França, no cinema francês, é adulto; ou seja ele acaba e quando acaba, ele fica, porque é amor. É intenso. é Físico. os casais estão menos interessados em jogar a responsabilidade de ser feliz no amor no colo do parceiro.
Nesses filmes franceses, e mesmo nos livros, tem muita conversa. Angústia e Tédio. Sentimentos humanos mais profundos e verdadeiros.
Acho o mundo adulto interessante. e o brasil é um país infantil e incapaz de ter um amor adulto, mesmo no cinema. Um encontro amoroso, adulto, assim, é muito raro.
A gente, aqui no cinema, fica feliz com a nossa história, adulta. Do Nosso encontro. Que claro são os melhores anos de nossa vida. A Sandra Dorgan percebeu isso.
Saímos do cinema e comprei alianças.
Tudo me faz chorar.
Um carro a cem por hora ás seis horas da manhã nas ruas de Paris,
por ex.
Uma despedida e um reencontro.
Não é um filme piegas. Nem aquela esperança vã. Nem de grandes mensagens.
O filme termina com essa cena, a da foto, eles vão conseguir ver o por do sol. Nós também.

terça-feira, 13 de julho de 2021

sentido



não acredite no que vê
não acredite no que ouve
não acredite no que fala
a realidade só pode ser sentida com o coração

terça-feira, 6 de julho de 2021

oh ruína



oh ruína onde quer que agarre
tudo esboroa
pouco brilho, nenhum contraste
uma massa só
ô dândi,
ô dândi
mas nem tudo é deslumbramento
aquele ar blasé
aquele sorriso de canto
é só um pouco de fingimento
estratégia de sobrevivência
cortina de fumaça
rockn'roll
enquanto fumo
tudo flutua
eu eu não estou nem aí

quinta-feira, 1 de julho de 2021

velocidade do WhatsApp

Não é a necessidade, nem a urgência ou a impaciência que te faz usar o recurso de aumentar a velocidade do WhatsApp. É a falência da escuta