quinta-feira, 31 de maio de 2012

fossemos fogo




Fossemos fogo
outra coisa qualquer
com vontade própria
usurpada extirpada
queimaríamos

Tivéssemos o desejo 
perfurada pelo vento
pelo sopro involuntário
de um desses deuses sem nome
arderíamos

Fossemos fogo
nossos corpos
do torpor se ergueriam
rasgaríamos as vestes
uma luta de travesseiros faríamos

Mas aqui o telefone não toca
seguimos invisíveis
sem sequer sorrir
desintegrados aos montes
feito cinzas que o fogo não tocou

terça-feira, 29 de maio de 2012

estudos de lógica transcendental


wittgeistein


enquanto vasculho as gavetas
em busca de uma coisa qualquer
que resignifique
que seja algo mais
que um cristal quebrado
percebo ser impossível
enganar-me
o que eu quero
é morder meu pé

segunda-feira, 28 de maio de 2012

o lugar





nos fundos lapsos

nos imensos vazios

nos vales intensos

nas profundezas abissais

nos vãos intensíssimos

nos superlativos abismos

nos buracos negros

na alma esburacada

na lama intacta

no caminho florido

na chama fria

na mente vazia

nas pegadas na areia

no coração inquieto

na fome de tudo

cabe o outro

sexta-feira, 25 de maio de 2012

juntos




necessariamente deve existir uma história
estamos vivemos de pedaços
pequenos fragmentos
palimpsestos
mensagens em garrafas
códigos saturados
mensagens do além
telex
latim
linguas mortas
ninguem mais se entende

miseravelmente
com as pernas bambas
gravamos nossas letras em sangue
tatuando no corpo das pessoas amadas
a única mensagem
que nos resta:
combater


manuscript invenit Sao Paulo in MDLIV



E os edificios altos
fortalezas horrendas
tomarão o lugar das casas
e as ruas todas serão dos autocarros

E as máquinas
curiosas armações de ferro e outros materiais
multiplicarão o trabalho
propondo uma nova velocidade
mas isso não lhes proporcionará descanso
ou alegria

Os artefatos
substituindo os homens em diversas atividades
modificarão toda a realidade
a tecnologia não será mais mero extensor de seus corpos
mas possuidora de conhecimento e autonomia

Os dias e as noites serão iguais
viverão todos apartados da natureza e das coisas simples da vida
e procurarão consolo em contendas estúpidas
dividir-se-ão em grupos de diferentes bandeiras
outorgando á outros sua diversão, prazer e autonomia

As canções serão infantis e estúpidas
propondo a satisfação de desejos primários e imediatos
a escatologia imperará
a amnésia será coletiva
os fatos lembrados não terão importância

Os velhos ficarão nas ruas fuçando no descarte em busca de comida
as crianças não serão obrigadas a aprender
e não aprenderão nada por si próprias
serão treinadas em formas diferentes de destruição
e tornar-se-ão frias perante á morte

E á vida será uma sucessão de flashes
um presente contínuo destituído de utopia ou desejo de transformação
como se não houvesse possibilidade de mudança
como se tudo fosse o que aparenta ser
como se tudo fosse como os antigos diziam

Os ambientes serão artificiais
sem luz natural, sem o rumor do vento ou o barulho da chuva
os bichos e as flores servirão aos humanos
como detalhes para satisfação de carências

A religião não merecerá esse nome
e medos infantis de tempos anteriores ao Renascimento retornarão
a Ciência servirá apenas à interesses de grupos privados
que viverão em fortalezas de ferro e aço isolados do resto
isolados de tudo
Passaram os dias e noites encarcerados
sem ver a luz do dia e a luz da noite
assistindo aos eventos selecionados por conglomerados de informação que no próprio interesse de manutenção de poder manipularão os acontecimentos
fazendo bobagens transformarem-se em fatos e verdades

Viverão alheios a si mesmos
sem forças para olharem-se e reconhecerem seu eu profundo e  seus outros eus

A leitura de códigos mágicos será feita por pouquissímos que serão considerados loucos
ou pior que isso
nínguem lhes dará crédito nenhum

Todos serão vítimas de epidemias variadas
câncer de cólon, vírus de computador, obediência cega
bacilos perturbadores, gripes de pássaros,incapacidade de relacionar-se com os outros sexualmente,
uniformização de pensamento, robotização de hábitos,
desamor, desintegração de personalidades, ruídos na mente, buracos na alma
vazios intermitentes
e na hora da despedida
dirão satisfeitos:
-Essa foi a vida que eu escolhi!

segunda-feira, 21 de maio de 2012

causalidade



aquilo que abre
fecha
e o que cintila
é passível de sentimento
também
tudo que reverbera
desordena o itinerário
antes da palavra
uma constelação
diante do espectro
uma grande angular
um panorama de coisas belas

sem tempo para chorumelas

sexta-feira, 18 de maio de 2012

viver quase me mata

paul klee - highway


viver quase me mata
viver sempre me espanta
viver às vezes me cansa

viver sem dúvida
é impossível
viver com certeza
é uma chatice

viver é o intervalo entre as viagens
viver é um reclame para quem não tem ouvidos
viver é o anúncio sem sentido

viver inspira minha loucura
viver expira minha paciência
viver entorpece meus sentidos
vive é uma danação sem fim

viver é uma armação dos diabos
um conto de fadas uma história para boi dormir
um lance de dados viciados


viver quase me mata
eu quase me acabo em viver
e é nisso tudo que eu me agarro
na dúvida e na certeza
na chatice e no intervalo da viagem
na loucura na danação
nos sete buracos da minha cabeça
e na cauda do diabo

viver quase me mata
e a um passo do abismo
há um passo em falso
estrela fake a me vigiar
suspiro brevidade cheesecake calda de chocolate
ginga
o coro grego me chama
de volta reviver
novolhar para não parar

viver quase me mata
mas a vida da minha mão não escapa

quinta-feira, 17 de maio de 2012

sobre tecnologia






fios

chiados

urros de ódio

o futuro está por um pio

sobre amigos e colegas



Um resquício da escravatura a não valorização do trabalho, ou demonstração da exaltada malandragem pátria, aqui o trabalho não é valorizado.

Assim o "colega" não é valorizado. Existe uma hierarquia nas relações onde o colega é menosprezado, o amigo endeusado.

Isso para começo de conversa, aqui do meio dela, explico: amigo, é aquele por quem se tem sentimento de afeto; colega, o que exerce a mesma atividade; trabalho, atividade que transforma a natureza em produtos.

Isto eu contei, ou escrevi : os amigos se contam nos dedos de uma mão. Aí eu pensei, e conto aqui: Amigos, amigos; negócios, à parte.

Um aparte: detesto a figura do ADA, amigo dos amigos, que é bom para aqueles e para o resto, o resto.E mais: Amigos a gente faz e a vida desfaz, e aqui também: Amigos são para sempre, embora eu não os suporte mais.

Meus amigos estão aí pelo mundo, muitos ficaram pelo caminho, outros saíram do caminho e muitos já partiram para outra.

A confraria dos loucos já esteve a pleno vapor, hoje está abandonada. A esquadrilha da fumaça já era. O Mangue, o Mantiqueira, já eram; tudo passou.

Não existe mágoa, por que tudo está aqui, a toda hora rola uma história, a toda hora rola uma nova história, qualquer esquina é o nosso lugar, basta um assobio, e nós voltaremos para lá.
 
de lobo solitário, o que é um oxímoro, e, bem: continuo a continuar.
 

sábado, 12 de maio de 2012

O Código Florestal - Veta tudo Dilma

Discutir os interesses envolvidos nas propostas de flexibilização do Código Florestal é um exercício para a promoção da cidadania e oportunidade para que sejam manifestadas posições e projetos para o Brasil.A reformulação do código envolve um debate no conjunto da sociedade, dividido entre ambientalistas e ruralistas, que defendem pontos de vista antagônicos.

Apontar todas as incoerências e falhas nos muitos artigos do Código Florestal, todos os pontos problemáticos -que promoverão desmatamento, ampliação de áreas vulneráveis, dispensa de recomposição de áreas e abrirão brechas para que mais de 90% dos imóveis sejam dispensados de recuperar suas reservas legais - é uma tarefa que não me proponho no momento. Dessa forma, e como o cerne da discussão concentra-se na disputa entre modelos de produção agrícola, é nesse ponto que esse texto se concentra.

Procuro resumir meu ponto de vista argumentando a favor da vida, contra o desmatamento e solidário a um novo modelo econômico no campo brasileiro, apoiando a agricultura familiar.

A agricultura familiar, os números não cabem aqui, é responsável por um importante papel especialmente nas cidades pequenas e na produção de alimentos, preponderantemente no Nordeste.

Acordar antes do Sol nascer, andar descalço no meio do mato, rezar para a plantação vingar não são uma realidade distante no nosso país. O apoio á agricultura familiar passa por uma mudança de mentalidade, com um diferente suporte que rompa o isolamento do produtor, inserindo-o numa rede moderna de amparo e vínculo, utilizando da tecnologia para a redução de impactos e melhores condições de existência. 


O agronegócio, que é a união dos latifundiários com as empresas transnacionais, mantém o modelo do monocultivo voltado à exportação, utiliza os agrotóxicos e a mecanização e expulsa os trabalhadores do campo. A agricultura familiar cria condições para a fixação das famílias no meio rural e defende a produção de alimentos sem veneno prioritariamente para o mercado interno.


Enquanto forma de organizar a produção de alimentos, conforme o exposto, agronegócio e agricultura familiar são incompatíveis. 

É possível discutir os problemas brasileiros sob diversos aspectos, procurar soluções da crise contínua de uma sociedade que não deu certo, de uma civilização que não existe, de um projeto que não houve. Enquanto professor de Geografia, entre as várias possibilidades de análise, tomo como exemplo daquilo que não deu certo a urbanização brasileira, a vida nas cidades,e nosso absoluto fracasso de convivência e cidadania. 

Nâo se pretende com a opção pela agricultura familiar uma volta forçada ao campo da parcela marginalizada que vive em condições sub-humanas nas metrópoles, nem a valorização de formas utópicas ou romantizadas de vida no campo. Nesse momento reafirmamos que uma mudança no modelo econômico no campo, favorecendo a agricultura familiar, traria enormes benefícios, gerando empregos e mitigando o problema da fome, além da produção de alimentos mais saudáveis e a revalorização de lugares e pessoas.


A flexibilização do Código Florestal significa a não promoção do equilíbrio ecológico, o  não uso sustentável dos recursos naturais e a injustiça social, mantendo a mesma situação de séculos no Brasil: um povo que passa fome, enquanto grandes empresas exportam alimentos.

Caso o projeto seja mantido , da  mesma forma que em outros momentos emblemáticos em nossa história recente - Campanha das Diretas Já, Plesbicito do Desarmamento - o Brasil,  infelizmente,  terá escolhido a alternativa conservadora e  assim permanece  fundeado a uma triste condição de coadjuvante nos processos civilizatórios do planeta.

Caso o projeto de flexibilização do Código Florestal não seja vetado pela presidenta Dilma seguiremos pelo mesmo caminho de miséria e infelicidade que são a tônica no nosso convívio.