quinta-feira, 23 de junho de 2011

letargia

                                       edward hopper

talvez eu devesse levantar e ir até a praça
dobrar os joelhos
e agradecer por respirar o gás imundo
e pela falta de estrelas á noite

talvez eu devesse assinar um manifesto contra todos
e organizar um texto correspondente
ao meu pensamento
ao meu cinismo
e a minha falta de objetividade
pedindo paz em nome das putas dos viados e de todos os esquecidos  pelos sindicatos

talvez eu pudesse como num suspiro
perceber toda estupidez em me levantar todo dia
e agradecer ao grande diretor dessa bagunça
por estar feliz com toda a criação
 (e ter a ousadia em pretender enganá-lo
me ajoelhando e fingindo obediência)
 - devo seguir esperando a sorte num bilhete de loteria

talvez eu consiga acreditar em algo como nacionalismo, ou que a vontade supera toda dificuldade, a fé move montanhas, em inclusão nas escolas, ou em comida light.

talvez eu volte a me enganar com toda sorte de drogas

talvez eu pudesse num grito interromper os homens
e dizer que os seus delírios
são somente sonhos mesquinhos
que um sal de fruta pode interromper o mal estar
e pedir para colocar o meu nome em primeiro lugar
naquela tão distante lista de assinaturas
(a da organização do texto do meu pensamento,
do meu cinismo e da minha falta de objetividade, das pessoas que não são assistidas por sindicatos  e etc.)
talvez eu devesse, permanecer em silêncio, brincando com o controle remoto, dando atenção aos noticiários esportivos, as novelas, as declarações dos políticos, aos pastores, bispos, as noivas, aos encantadores de cães, as moças que mostram as nádegas e os cus arregaçados.


talvez eu possa levantar minha bunda da cadeira
e assistir da janela  aos risos histéricos e degradantes
que saem da minha propria imagem refletida
nos rostos de tantos outros que insistem
em colocar a música alta
forçando-me  a levantar e gritar bem alto
(para que eu possa ouvir minha voz)
dizendo:

- Talvez isso tudo não seja tão ruim assim!

talvez se eu dobrar novamente os joelhos
e uma súplica possa chegar
ao ouvido de alguem que suporte
mais de 140 toques em algum texto
e juntando-se a essa imensa caravana de gente mansa
que passa as tarde repetindo mantras e desafios
como Klaus Kinski e sua covardia disfarçada em destempero
possa repetir que:

- Sim talvez o mundo não seja somente ilusão!

e se eu finalmente reunir forças
e me levantar
e cantar:

- Eu tenho uma casinha lá na marambaia...
essa casa esteja lá me esperando.

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