quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Francisco Ramires de Pórros

De origem espanhola era o pai de Bartholomeu Bueno da Ribeira...

Eu sou o avô do avô do avô do avô do avô do avô.

Eu fiz o meu destino, eu o fiz.

Eu fui o sujeito, antes dele existir.

O verbo sou eu.

Eu sou eu.

Eu vi; e agora outros também.

Na grande noite sem Lua nem estrelas, do alto do monte, no meio da mata, eu  vi aldeias incendiadas.

Eu queimei as aldeias, que ainda ardem, antes da procissão das velas  mentirosas, do cunhadismo, dos livros serem escritos.

Eu sou antes. Eu sou antes da noite anterior.

Assassinatos, estupros, mulheres violadas,crianças estraçalhadas.

Na manhã seguinte, no outro dia, na outra aldeia,despertos do pesadelo eles novamente se entregaram a mim, felizes e alegres como quem se entrega a um destino sagrado.

A felicidade é vã, a alegria  é estúpida.

Minha faca sangrou e cortou a carne dos jovens . O sangue dos indios escorreu para a terra que foi cultivada no dia seguinte. As cabeças dos velhos, as entranhas das virgens, tudo escorreu para o chão que agora os alimenta.

Tudo inútil, o ouro foi pouco, a prata nenhuma.

E eu continuei a andar. Andar dias e noites, vagar na terra, sem ouro e sem nada.

Para onde olhava, havia somente  o verde escuro da mata.

Mato sem nome, árvore sem nome, bicho sem nome. Casa, montanha, rio. Mato, mato, mato.

Com que língua lhes falei? A lingua das pancadas. Que língua entenderam? A língua do meu facão.

Não tive ouro, nenhum cobre.

Não tive armadura, sapatos.

Cheguei a vila, ás taperas, a sua praça sem nome. Dormi em seus catres, compartilhei sua miséria.

O que disso ficou?

Uma linha: com o Pai ele chegou.

Mas vagando eu continuo dentro da noite, no escuro da mata. Um corpo de  velho nu, estropiado. Cabelos desgrenhados, as mãos tremendo , os olhos não vêem, tenho fome.  Sou um corpo cansado, ainda procurando ouro.

Mas eu sou aquele que fala, sou aquele que procura.  Sou você que me achou.

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